quarta-feira, 6 de abril de 2022

O carneirinho do presépio, de José Faria Nunes (Exercícios com gabarito)

 

O carneirinho do presépio

O menino observa as pessoas que saem e volta-se para o presépio. Examina-o com interesse. Na missa ouviu que o reino dos céus é das crianças.

Tempestade mental. Se é das crianças o céu e viver no céu é ser feliz, então a felicidade é das crianças.

 Olha o presépio. O boi. O carneirinho. Os astrônomos que foram chamados reis — os reis magos. A estrela. Tudo bonito. Tudo. Enamora-se. Bem que queria um desses. O carneirinho. Só o carneirinho. O Menino Jesus, esse não. Tem que ficar no presépio. Presépio sem Menino Jesus não é presépio. O carneirinho, esse sim. Há outros no presépio.

 Não tivera Natal em casa. Nunca. Não conhece Papai Noel. “Será que Papai Noel me conhece? Sabe de minha existência?

Na sua frente, o carneirinho cresce, apequena, atrai. Por que o padre falou que o céu é das crianças?

Não ganhou brinquedo e quer o carneirinho. Será pecado? O que é pecado? Para que pecado? Se é verdade que Deus ama a gente, por que ele deixou a cobra dar a maçã para Eva e Eva para Adão para depois todo mundo ter pecado?

Ele quer o carneirinho. Todos já se foram. Ninguém vê. O Cristo, crucificado, parece dormir de cansaço e de dor na cruz, na parede, lá atrás do altar. Parece não se importar com nada ali na igreja. Coitadinho de Cristo. Sofreu muito. Mas por que, se ele é Deus? Ou ele é apenas o Filho de Deus? Se é filho não é pai e se Deus é pai não é filho?!

Coitadinho de Cristo! O padre falou que Cristo sofreu para o perdão dos pecados. Não sei não. Acho que Cristo não sofreu por mim não. Papai Noel não me conhece. Será que Cristo me conhece?

 Esfrega as mãos, nervoso. A decisão. Ergue o braço, mas o gesto fica suspenso no ar com a chegada do vigário que vem fechar a igreja. Para disfarçar a intenção, limpa com o dedinho o espelho que forma o lago nas proximidades da gruta de Belém. Por que presépio em forma de gruta? Cristo nasceu não foi num ranchinho, na estrebaria, casa de animais?

— O Sinhore vai fechá a igreja? — Pergunta ao padre que fecha a primeira porta.

            — Estou fechando — Responde o padre, em seu sotaque de estrangeiro, não com aquele carinho com que falou na missa da meia-noite.

            — O presepe tá bunito, né? — insiste o menino, tentando coragem para pedir o carneirinho.

            — Você acha? — o padre fala indiferente e o menino entende que o vigário não está interessado naquele diálogo, quase monólogo.

— Acho — termina o menino, desconcertado, infeliz. Percebe que de nada adiantará insistir. Não vai ganhar o presente.

Absorto nos sonhos, fica a olhar o presépio sem nada ver.

 “Como eu queria um carneirinho desse!”

 E o vigário o acorda para a realidade:

— Vamos embora, dormir?

 — Vamo.

Volta-se e ainda dirige um último olhar para o carneirinho do presépio, um ente querido que talvez jamais voltará a ver. O padre fecha a última porta e se vai.

 O menino, agora com medo, corre debaixo da madrugada em direção ao aconchego que o espera debaixo da ponte, onde se juntará aos pais e aos cinco irmãos menores. Dormem. Não veem a fome, não sentem nenhum desejo. Enquanto dormem, os sentidos nada reclamam. Ele sonha com o presente de Natal que não ganhou: o carneirinho do presépio.

                                                                   José Faria Nunes

01. O texto “O carneirinho do presépio” é um conto. O conto pertence ao grupo dos gêneros narrativos ficcionais. Os textos narrativos apresentam alguns elementos em comum, como fatos, personagens, tempo, espaço, narrador. No conto lido:

a) Quais são as personagens envolvidas na história?

O menino e o padre.

 b) Onde acontece os fatos narrados?

Na igreja.

c) No conto, os fatos são narrados em sequência temporal e mantêm entre si relação de causa e efeito. Por exemplo: O menino decide pegar o carneirinho do presépio, mas quando ergue o braço para pegá-lo, o padre entra. O menino, então, disfarça, limpando com o dedo o espelho que forma o lago no presépio. Cite outros fatos do texto dispostos em sequência temporal e ligados a uma relação de causa e efeito.

O menino observa as pessoas que saem e volta-se para o presépio, enamora-se e deseja uma das peças. Escolhe um carneirinho que não faria falta. / O padre o convida para ir embora e ele aceita. Volta-se e olha o carneirinho do presépio pela última vez.

d) Em que época acontecem os fatos narrados? Em que lugar?

No Natal, depois da missa da meia-noite, numa igreja onde está montado um presépio.

02. No conto em estudo, os fatos narrados são vividos pelo menino e pelo padre.

a) Levante hipóteses: Por que essas personagens não têm nome?

O menino representa qualquer garoto pobre que não recebe presente de Natal, e o padre representa qualquer padre, indiferente ao sonho de um menino de ganhar um presente de Natal.

b) As personagens podem ser caracterizadas física e psicologicamente. Como é o menino? E o padre?

O menino é pequeno, pobre, tem família, pais e cinco irmãos menores; é morador de rua e dorme com a família debaixo da ponte. O padre é estrangeiro, pois tem sotaque e é indiferente.

03. Releia os três primeiros parágrafos do texto e responda: Em que trecho a narrativa começa a criar expectativa para o leitor?

No momento em que o menino se enamora do carneirinho e o quer para si.

04. O menino quer o carneirinho do presépio e pensa sobre o que ouviu na missa.

a) Por que ele não quer o Menino Jesus?

Porque ele é único e faria falta no presépio.

b) Que tipo de discurso o narrador emprega para apresentar o pensamento do menino?

O discurso indireto livre.

c) Qual é o momento de maior tensão no texto?

O momento em que, decidido, o menino ergue o braço para pegar o carneirinho e o vigário chega para fechar a igreja.

05. O conto em estudo narra uma história que pode ser real e vivida por muitas crianças que desejam algo, mas não o tem. Na sua opinião, o menino do conto teria cometido um crime se furtasse o carneirinho do presépio? Justifique sua resposta.

 

BONS ESTUDOS!

Fonte: Português linguagens: volume 2 / William Roberto Cereja, Thereza Cochar Magalhães. --- 7. ed. reform. --- São Paulo: Saraiva, 2010.

 

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