quarta-feira, 21 de dezembro de 2016

"A literatura e a formação do homem": fragmento



    Um certo tipo de função psicológica é talvez a primeira coisa que nos ocorre quando pensamos no papel da literatura. A produção e a fruição desta se baseiam numa espécie de necessidade universal de ficção e de fantasia, que de certa forma é coextensiva ao homem, por aparecer invariavelmente em sua vida, como indivíduo e como grupo, ao lado da satisfação das necessidades mais elementares. E isto ocorre no primitivo e no civilizado, na criança e no adulto, no instruído e no analfabeto. A literatura propriamente dita é uma das modalidades que funcionam como resposta a essa necessidade universal, cujas formas mais humildes e espontâneas de satisfação talvez sejam coisas como a anedota, a adivinha, o trocadilho, o rifão. Em nível complexo surgem as narrativas populares, os cantos folclóricos, as lendas, os mitos. No nosso ciclo de civilização, tudo isto culminou de certo modo nas formas impressas, divulgadas pelo livro, o folheto, o jornal, a revista: poema, conto, romance, narrativa romanceada.
    Mais recentemente, ocorreu o boom das modalidades ligadas à comunicação pela imagem e à redefinição da comunicação oral, propiciada pela técnica: fita de cinema, radionovela, fotonovela, história em quadrinhos, telenovela. Isto, sem falar no bombardeio incessante da publicidade, que nos assalta de manhã à noite, apoiada em elementos de ficção, de poesia e em geral da linguagem literária.
Portanto, por via oral ou visual; sob formas curtas e elementares, ou sob complexas formas extensas, a necessidade de ficção se manifesta a cada instante; aliás, ninguém pode passar um dia sem consumi-la, ainda que sob a forma de palpite na loteria, devaneio, construção ideal ou anedota. E assim se justifica o interesse pela função dessas formas de sistematizar a fantasia, de que a literatura é uma das modalidades mais ricas.

boom: crescimento rápido, ação intensa.
fruição: ato ou efeito de fruir, isto é, de aproveitar ou desfrutar prazerosamente algo.
rifão: espécie de provérbio popular que transmite um ensinamento moral.


                                                      ( Antonio Candido )



          A PROPÓSITO DO TEXTO

1. De acordo com Antonio Candido, a literatura satisfaz uma necessidade essencial do ser humano.
a) Qual é essa necessidade?
    
                É A NECESSIDADE DE FICÇÃO E FANTASIA

b) Qual o perfil das pessoas que têm essa necessidade?

       OS SERES HUMANOS EM GERAL TÊM ESSA NECESSIDADE, INDEPENDENTEMENTE DE SUA FORMAÇÃO ESCOLAR OU DE SUA POSIÇÃO SOCIAL.


quinta-feira, 15 de dezembro de 2016

Exercícios sobre o Pré - Modernismo ( com gabarito )

Texto I
            Então, a travessia das veredas sertanejas é mais exaustiva que a de uma estepe nua.                     Nesta, ao menos, o viajante tem o desafogo de um horizonte largo e a perspectiva das planuras francas.                                                                                                                                           Ao passo que a outra o afoga; abrevia-lhe o olhar; agride-o e estonteia-o; enlaça-o na trama espinescente e não o atrai; repulsa-o com as folhas urticantes, com o espinho, com os gravetos estalados em lanças, e desdobra-se-lhe na frente léguas e léguas, imutável no aspecto desolado; árvore sem folhas, de galhos estorcidos e secos, revoltos, entrecruzados, apontando rijamente no espaço ou estirando-se flexuosos pelo solo, lembrando um bracejar imenso, de tortura, da flora agonizante…

CUNHA, E. Os sertões. Disponível em: http://pt.scribd.com. Acesso em: 2 jun. 2012.

1) De acordo com o texto I, como se caracteriza o lugar onde vive o sertanejo?


Texto II

         O sertanejo
            O sertanejo é, antes de tudo, um forte. Não tem o raquitismo exaustivo dos mestiços neurastênicos do litoral.
            A sua aparência, entretanto, ao primeiro lance de vista, revela o contrário. Falta-lhe a plástica impecável, o desempenho, a estrutura corretíssima das organizações atléticas.
            É desgracioso, desengonçado, torto. Hércules-Quasímodo, reflete no aspecto a fealdade típica dos fracos. O andar sem firmeza, sem aprumo, quase gigante e sinuoso, aparenta a translação de membros desarticulados.  [...]
            Reflete a preguiça invencível, a atonia muscular perene, em tudo: na palavra remorada, no gesto contrafeito, no andar desaprumado, na cadência langorosa das modinhas, na tendência constante à imobilidade e à quietude.
            Entretanto, toda esta aparência de cansaço ilude.
            Nada é mais surpreendedor do que vê-la desaparecer de improviso. Naquela organização combalida operam-se, em segundos, transmutações completas. Basta o aparecimento de qualquer incidente exigindo-lhe o desencadear das energias adormecidas. O homem transfigura-se. Empertiga-se, estadeando novos relevos, novas linhas na estatura e no gesto; e a cabeça firma-se-lhe, alta, sobre os ombros possantes aclarada pelo olhar desassombrado e forte; e corrigem-se-lhe, prestes, numa descarga nervosa instantânea, todos os efeitos do relaxamento habitual dos órgãos; e da figura vulgar do tabaréu canhestro reponta, inesperadamente, o aspecto dominador de um titã acobreado e potente, num desdobramento surpreendente de força e agilidade extraordinárias.

2) No texto II, contrapondo o sertanejo ao homem do litoral, o narrador descreve os aspectos contraditórios da constituição física e do comportamento do sertanejo. Explique essa contradição. 

3) Que personagens da literatura foram utilizadas para dar ideia de quanto a figura do sertanejo é contraditória?

4) Na oposição entre o homem do litoral e o sertanejo, interprete: Quem é o mais forte, segundo o ponto de vista do narrador? Justifique sua resposta.


5) Marque a opção correta: ´´ Contextualizado no fim do século XIX, no Rio de Janeiro,_________________________, o principal romance de _____________________________, narra os ideais e a frustração do funcionário público, sonhador e ingênuo....Sua primeira decepção se dá quando sugere a substituição do português, como língua oficial, pelo tupi. O resultado é sua internação em um hospício”.

a)      Os Sertões / Euclides da Cunha
b)      Triste fim de Policarpo Quaresma / Lima Barreto
c)      Urupês / Monteiro Lobato
d)     Eu / Augusto dos Anjos

e)      Canaã / Graça Aranha 

6) O texto a seguir é um fragmento da crônica Urupês de Monteiro Lobato.
                                            TEXTO III
 Pobre Jeca Tatu! Como és bonito no romance e feio na realidade!
Jeca mercador, Jeca lavrador, Jeca filósofo...
Quando comparece às feiras, todo mundo logo adivinha o que ele traz: sempre coisas que a natureza derrama pelo mato e ao homem só custa o gesto de espichar a mão e colher - cocos de tucum ou jissara, guabirobas, bacuparis, maracujás, jataís, pinhões, orquídeas; ou artefatos de taquarapoca - peneiras, cestinhas, samburás, tipitis, pios de caçador; ou utensílios de madeira mole - gemelas, pilõezinhos, colheres de pau.
Nada Mais.
Seu grande cuidado é espremer todas as consequencias da lei do menor esforço - e nisso vai longe.
Um terreirinho descalvado rodeia a casa. O mato o beira. Nem árvores frutíferas, nem horta, nem flores - nada revelador de permanência.
Há mil razões para isso: porque não é a sua terra; porque se o "tocarem" não ficará nada que a outrem aproveite; porque para frutas há o mato; porque a "criação" come; porque....
_ Mas, criatura, com um vedozinho por ali... A madeira está à mão o cipó é tanto...
Jeca, interpelado, olha para o morro coberto de moirões, olha para o terreiro nu, coça a cabeça e cuspilha.
_ Não paga a pena.
Todo o inconsciente filosofar do caboclo grulha nessa palavra atravessada de fatalismo e modorra.
Nada paga a pena. Nem culturas, nem comodidades.
De qualquer jeito se vive.

a) O texto descreve Jeca Tatu em três papéis: o de mercador, o de lavrador e o de filósofo. Como se sai Jeca nesses papéis? 

b) Que comportamentos de Jeca comprovam a afirmação do narrador de que “ Seu grande cuidado é espremer todas as consequências da lei do menor esforço”?

Texto IV
Psicologia de um vencido

Eu, filho do carbono e do amoníaco,
Monstro de escuridão e rutilância,
Sofro, desde a epigênese da infância,
A influência má dos signos do zodíaco.

Profundissimamente hipocondríaco, 
Este ambiente me causa repugnância... 
Sobe-me à boca uma ânsia análoga à ânsia 
Que se escapa da boca de um cardíaco.

Já o verme — este operário das ruínas —
Que o sangue podre das carnificinas 
Come, e à vida em geral declara guerra,

Anda a espreitar meus olhos para roê-los, 
E há de deixar-me apenas os cabelos, 
Na frialdade inorgânica da terra!
Augusto dos Anjos ANJOS, A. Eu e Outras Poesias. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1998.

7) Destaque do texto vocábulos empregados poeticamente por Augusto dos Anjos e tradicionalmente considerados antipoéticos.

 8) Como o eu lírico encara a vida e a si mesmo nas duas primeiras estrofes?

9)Que enfoque é dado à morte nas duas últimas estrofes?

10) O título é uma espécie de síntese das ideias do poema. Justifique-o.




                                                                       RESPOSTAS

1) No sertão nordestino, a natureza mostra-se rude e pouco receptiva ao homem.

2) Por um lado, o sertanejo mostra-se fraco,feio, desengonçado, preguiçoso, cansado; por outro, mostra-se forte, impulsivo e valente.

3) Hércules-Quasímodo, para mostrar o lado fraco, e titã, para mostrar o lado forte.

4) É o sertanejo, pois, de acordo com o texto, o homem do litoral tem um raquitismo neurastênico, ao passo que o sertanejo parece ser fraco e indolente, mas surpreende pela vontade e pela força.

5)  B

6. a) Sai-se mal, pois não planta ( o lavrador ), só vende o que a natureza oferece ( o mercador ) e pensa ( o filósofo ) que " nada paga a pena ", pois a terra não é sua.

    b) O fato de consumir e vender apenas o que a natureza oferece e de não promover melhorias em sua casa.

7) Carbono, amoníaco, epigênesis, hipocondríaco, verme,etc.

8) Vê a vida e a si mesmo de forma pessimista, pois entende que o homem é matéria, química, e considera que tudo caminha para a destruição.

9) A morte é considerada o destino final e fatal de toda forma de vida. Cabe ressaltar também a crueza do tratamento dado à morte, representada pela imagem do verme a comer " sangue podre ".

10) Embora o título contenha a palavra psicologia, o poema detém-se a tratar da matéria das substâncias químicas que formam o eu, evitando maior introspecção. Apesar disso, é possível constatar o negativismo interior do eu lírico, que se considera " vencido " em virtude da fragilidade física do ser humano e da força implacável da morte.




terça-feira, 13 de dezembro de 2016

Canção do exílio, de Gonçalves Dias (Exercícios com gabarito)

Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá;
As aves, que aqui gorjeiam,                        aqui (Portugal)
Não gorjeiam como lá.                                 lá (Brasil)
Nosso céu tem mais estrelas,
Nossas várzeas têm mais flores,
Nossos bosques têm mais vida,
Nossa vida mais amores.
Em cismar – sozinho – à noite –
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Minha terra tem primores,
Que tais não encontro eu cá;                             cá (Portugal - lugar do exílio) 
Em cismar – sozinho – à noite –
Mais prazer encontro eu lá;                               lá (Brasil - terra natal)
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Não permita Deus que eu morra,
Sem que eu volte para lá;
Sem que eu desfrute os primores
Que não encontro por cá;
Sem qu'inda aviste as palmeiras,
Onde canta o Sabiá.

Obs.:Trata-se de um dos poemas  mais conhecidos da literatura brasileira. Foi escrito em 1843, em Coimbra, onde Gonçalves Dias fazia seus estudos universitários. O poeta vivia uma situação de exílio, porém voluntário, e não político.

1. Qual das estrofes da canção é lembrada no Hino Nacional Brasileiro por uma citação parcial?

A segunda estrofe da canção. 

2. A distância e a saudade provocam a distorção da imagem da terra natal, cuja natureza é minuciosamente comparada com a da terra do exílio.
 a) A oposição e a distância são marcadas por dois advérbios repetidos ao longo do poema. quais são eles e o que cada um representa?

 O advérbio "cá" representa a terra do exílio ( Portugal ), e o advérbio "lá" representa a terra natal ( o Brasil ).

b) Entre os diversos elementos da natureza, dois se destacam e se tornam símbolos da pátria distante. Quais são eles? 

São eles: o sabiá e a palmeira.

3. Os críticos literários atribuem a extraordinária beleza da canção à simplicidade dos recursos expressivos utilizados. Analisemos alguns deles:
a) Métrica: versos redondilhos, que dão ao poema um ritmo bem marcado e de gosto popular. Transcreva os dois primeiros versos e faça a escansão. 

     Mi / nha / ter / ra / tem / pal / mei / ras
         On / de / can / ta o / Sa / bi / á       

b) Rimas: alternância de versos rimados ( pares ) com versos brancos ( ímpares ). Quais são as três palavras que se repetem em posição de rima, ao longo de quase todo o poema?

Sabiá, cá e lá.

c) Paralelismo: um terço da canção compõe-se de versos repetidos. Dois desses versos funcionam como refrão. Quais são eles?
 
 " Minha terra tem palmeiras / Onde canta o Sabiá"   

4. O nacionalismo, traduzido na expressão intensa da saudade da terra natal ( emocionalismo ) e na exaltação da natureza tropical ( cor local ), é a principal característica romântica do poema. Podemos ainda apontar um outro tema característico do Romantismo em dois versos que se repetem uma vez ao longo do poema. Localize e comente esses versos. 

Os versos são: " Em cismar, sozinho, à noite, / Mais prazer encontro eu lá". Trata-se do pessimismo e do escapismo românticos, traduzidos no gosto pelo ambiente noturno, no prazer do devaneio, no culto da imaginação e do sonho.


FONTE: 
Novas palavras: língua portuguesa: ensino médio / Emília Amaral ... [et al]. --- 2. ed. renov. ---
São Paulo: FTD, 2005. --- (Coleção novas palavras)
               

sábado, 10 de dezembro de 2016

Nem tudo é fácil







Resultado de imagem para cecilia meireles





É difícil fazer alguém feliz, assim como é fácil fazer triste.
É difícil dizer eu te amo, assim como é fácil não dizer nada.
É difícil ser fiel, assim como é fácil se aventurar.
É difícil valorizar um amor, assim como é fácil perdê-lo para sempre.
É difícil agradecer pelo dia de hoje, assim como é fácil viver mais um dia.
É difícil enxergar o que a vida traz de bom, assim como é fácil fechar os
olhos e atravessar a rua.
É difícil se convencer de que se é feliz, assim como é fácil achar que
sempre falta algo.
É difícil fazer alguém sorrir, assim como é fácil fazer chorar.
É difícil colocar-se no lugar de alguém, assim como é fácil olhar para o
próprio umbigo.
Se você errou, peça desculpas…
É difícil pedir perdão?
Mas quem disse que é fácil ser perdoado?
Se alguém errou com você, perdoa-o…
É difícil perdoar?
Mas quem disse que é fácil se arrepender?
Se você sente algo, diga…
É difícil se abrir?
Mas quem disse que é fácil encontrar alguém que queira escutar?
Se alguém reclama de você, ouça…
É difícil ouvir certas coisas?
Mas quem disse que é fácil ouvir você?!
Se alguém te ama, ame-o…
É difícil entregar-se?
Mas quem disse que é fácil ser feliz?!
Nem tudo é fácil na vida…
Mas, com certeza, nada é impossível…
Precisamos acreditar, ter fé e lutar para que não apenas sonhemos,
Mas também tornemos todos estes desejos realidade!
Cecilia Meireles

sexta-feira, 9 de dezembro de 2016

Com licença poética



Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta, anunciou:
vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado pra mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não sou tão feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas o que sinto escrevo. Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
-- dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou.
Adélia Prado , Bagagem. São Paulo: Siciliano. 1993. p. 11.