sexta-feira, 2 de dezembro de 2022

Ismália, de Alphonsus de Guimaraens (Exercícios resolvidos)

 


O poema que segue é o mais popular de Alphonsus de Guimaraens.

Ismália

Quando Ismália enlouqueceu,
Pôs-se na torre a sonhar…
Viu uma lua no céu,
Viu outra lua no mar.

No sonho em que se perdeu,
Banhou-se toda em luar…
Queria subir ao céu,
Queria descer ao mar…

E, no desvario seu,
Na torre pôs-se a cantar…
Estava perto do céu,
Estava longe do mar…

E como um anjo pendeu
As asas para voar…
Queria a lua do céu,
Queria a lua do mar…

As asas que Deus lhe deu
Ruflaram de par em par…
Sua alma subiu ao céu,
Seu corpo desceu ao mar…

(Alphonsus de Guimaraens)

1. Alguns poemas de Alphonsus de Guimaraens ligam-se à tradição medieval. Observe no texto os seguintes aspectos formais: métrica, ritmo e paralelismo.

a) O poema em estudo liga-se ou não a essa tradição? Justifique.

Sim, pois faz uso da redondilha maior, de versos ritmados e de estruturas paralelísticas, como “Viu uma lua no céu, / Viu outra lua no mar”, recursos comuns na poesia medieval.

b) Que outro movimento literário perseguiu a mesma tradição medieval?

O Romantismo.

2. Todo o poema é construído com base em antíteses. As antíteses articulam-se em torno dos desejos contraditórios de Ismália, que se dividem entre a realidade espiritual e a realidade concreta.

a) Identifique dois pares de antíteses no texto.

céu / mar; perto / longe; subiu / desceu

b) Reconheça o elemento que representa a realidade espiritual e o que representa a realidade concreta.

A lua do céu representa a realidade espiritual; a lua do mar, a realidade concreta.

3. O Simbolismo , por ser um movimento antilógico e antirracional, valoriza os aspectos interiores e pouco conhecidos da alma e da mente humana. Identifique no texto palavras ou expressões que comprovem essa característica simbolista.

Enlouqueceu, sonhar, desvario.

4. Tal qual no Barroco e no Romantismo, o poema estabelece relações entre corpo e alma ou matéria e espírito. Com base no desfecho do poema, responda:

a) Céu e mar relacionam-se ao universo material ou espiritual?

O céu recebe a alma; logo, liga-se ao aspecto espiritual. O mar recebe o corpo; logo, representa o universo material.

b) Ismália conseguiu realizar o desejo simbolista de transcendência espiritual?

De acordo com o conceito simbolista, sim: por meio da morte, Ismália transcende o mundo material e integra-se ao cosmos.

c) Pode-se afirmar que, para os simbolistas, sonho e loucura levam à libertação? Justifique.

Sim, porque, para os simbolistas, a razão e a lógica aprisionam o homem. Dar vazão ao mundo interior, explorar zonas ocultas da mente humana é o mesmo que transcender os limites do mundo material.

 

                                                BONS ESTUDOS!

sábado, 26 de novembro de 2022

Interpretação textual: Roda (1942), quadro de Milton Dacosta

 

Observe atentamente o quadro Roda (1942), de Milton Dacosta, um dos mais importantes pintores brasileiros:

                                                     


 

1. Milton Dacosta nasceu em Niterói, em 1945. Sua carreira firmou-se a partir de 1933, quando participou de uma exposição no Salão Nacional de Belas-Artes. Tal como nas obras de alguns poetas do período, nas obras de Dacosta também se veem influências das correntes de vanguarda, especialmente do Cubismo e do Surrealismo.

a) Que aspectos do quadro se ligam ao Cubismo?

A geometrização das personagens: ângulos no rosto e no corpo, formas geométricas nos vestidos, no cabelo e na fita do cabelo.

b) Que aspectos se ligam ao Surrealismo?

Certo estranhamento decorrente sobretudo do fato de as crianças não terem rosto.

2. Intitulado Roda, o quadro retrata uma situação em que crianças de diferentes idades brincam de roda. Observe as personagens: o corpo, o rosto, a pele e as roupas.

a) Qual é o aspecto mais inquietante na representação dessas personagens?

A falta de rosto.

b) As cores das roupas que elas usam são vivas ou apagadas?

São vivas.

c) As crianças se parecem com pessoas reais ou parecem artificiais, como se fossem bonecos? Por quê?

Parecem bonecos: não tem rosto e, em vez de pele, o corpo parece revestido de madeira ou papel.

3. observe agora os elementos que compõem o cenário em que as personagens se encontram.

a) Trata-se de um cenário natural ou artificial? Caracterize-o.

Um cenário artificial; não há nem planta, nem animal, nem casa; há apenas quatro troncos ou estacas fincadas na terra. O solo, de uma cor verde, também não parece ser de terra nem coberto por vegetação.

b) O que o cenário como um todo expressa?

Uma paisagem desértica, sem vida, que suscita impressões como o vazio, o nada, a solidão.

4. Visto no conjunto, nota-se que o quadro reúne elementos contraditórios, que podem ser organizados em pares, como ser e não ser, natural e artificial ou vida e morte. Identifique na obra elementos relacionados:

a) com o universo natural ou coma vida;

As crianças brincarem de roda, as flores ao seu redor, as cores vivas dos vestidos.

b) com o universo artificial ou com a morte.

As flores jogadas no chão, as crianças que parecem bonecos, a paisagem desértica e sem vida.

5. A criança sempre foi associada à ideia de ingenuidade, de pureza. Nesse quadro, as crianças revelam essas características? Justifique.

Sugestão: Até certo ponto, pois o quadro, ao mesmo tempo que expressa uma ideia de pureza infantil, retrata as crianças como seres autômatos, sem identidade e sem vida.

6. O quadro foi pintado em 1942. As crianças que vemos brincam de roda e, por isso, têm as mãos dadas. Em 1940, Carlos Drummond de Andrade publicou o poema “Mãos dadas”, em que se lê:

         “O presente é tão grande, não nos afastemos.

          Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.”

a) Em qual contexto sociopolítico, nacional e internacional, o poema e o quadro foram produzidos?

No contexto internacional da Segunda Guerra Mundial e no contexto nacional do Estado Novo.

b) É possível afirmar que no quadro de Dacosta as crianças representam a união, a solidariedade e a esperança de um futuro melhor?

Sugestão: É possível que não. O aspecto artificial das crianças e da paisagem impossibilita associar a cena, apesar das mãos dadas, a um futuro de união e solidariedade.

7. Em 1942, Carlos Drummond de Andrade publicou o poema “José”, cujos versos finais são:

               “Sozinho no escuro

                qual bicho do mato,

                sem teogonia,

                sem parede nua

                para se encostar,

                sem cavalo preto

                que fuja a galope,

                você marcha, José!

                José, para onde? ”

Estabeleça relações de semelhança entre “José” e o quadro de Dacosta.

Sugestão: Parece que Dacosta deixa em aberto a resposta às perguntas: Qual o futuro dessas crianças? Será que a união e a ingenuidade infantis têm força para vencer o vazio do mundo? Para onde caminha a humanidade? Essa mesma incerteza quanto ao futuro está presente nos versos de Drummond.

8. Como você viu, a poesia de 1930-40 apresenta diferentes tendências: a filosófico-metafísica, de caráter existencial, social, a religiosa ou espiritual, a sensual, a regional, a histórica. Com qual ou quais dessas tendências o quadro de Dacosta mostra maior afinidade? Por quê?

Com a poesia filosófico-metafísica e com a poesia social. Com a primeira, pelo fato de o quadro lidar com a questão do ser/não ser das crianças, associada à definição da essência humana ou artificial das figuras. Com a segunda, pelo fato de ser possível relacionar alguns aspectos do quadro (a falta de identidade, a paisagem desértica) com o contexto da Segunda Guerra Mundial.

 

     BONS ESTUDOS!

sexta-feira, 25 de novembro de 2022

O Quinze, de Rachel de Queiroz - exercícios com gabarito

 

O episódio a ser lido retrata as dificuldades de Chico Bento e sua família durante a viagem de retirada.

 

            Eles tinham saído na véspera, de manhã, da Canoa.

            Eram duas horas da tarde.

            Cordulina, que vinha quase cambaleando, sentou-se numa pedra e falou, numa voz quebrada e penosa:

             - Chico, eu não posso mais... Acho até que vou morrer. Dá-me aquela zoeira na cabeça!

            Chico Bento olhou dolorosamente a mulher. O cabelo, em falripas sujas, como que gasto, acabado, caía, por cima do rosto, envesgando os olhos, roçando na boca. A pele, empretecida como uma casca, pregueava nos braços e nos peitos, que o casaco e a camisa rasgada descobriam.

(...)

            No colo da mulher, o Duquinha, também só osso e pele, levava, com um gemido abafado, a mãozinha imunda, de dedos ressequidos, aos pobres olhos doentes.

             E com a outra tateava o peito da mãe, mas num movimento tão fraco e tão triste que era mais uma tentativa do que um gesto.

            Lentamente o vaqueiro voltou as costas; cabisbaixo, o Pedro o seguiu.

             E foram andando à toa, devagarinho, costeando a margem da caatinga.

             (...)

             De repente, um bé!,agudo e longo, estridulou na calma.

             E uma cabra ruiva, nambi, de focinho quase preto, estendeu a cabeça por entre a orla de galhos secos do caminho, aguçando os rudimentos de orelha, evidentemente procurando ouvir, naquela distensão de sentidos, uma longínqua resposta a seu apelo.

            Chico Bento, perto, olhava-a, com as mãos trêmulas, a garganta áspera, os olhos afogueados.

            O animal soltou novamente o seu clamor aflito.

            Cauteloso, o vaqueiro avançou um passo.

             E de súbito em três pancadas secas, rápidas, o seu cacete de jucá zuniu; a cabra entonteceu, amunhecou, e caiu em cheio por terra.

            Chico Bento tirou do cinto a faca, que de tão velha e tão gasta nunca achara quem lhe desse um tostão por ela. Abriu no animal um corte que foi de debaixo da boca até separar ao meio o úbere branco de tetas secas, escorridas.

            Rapidamente iniciou a esfolação. A faca afiada corria entre a carne e o couro. Na pressa, arrancava aqui pedaços de lombo, afinava ali a pele, deixando-a quase transparente.

            Mas Chico Bento cortava, cortava sempre, com um movimento febril de mãos, enquanto Pedro, comovido e ansioso, ia segurando o couro descarnado.

            Afinal, toda a pele destacada estirou-se no chão.

            E o vaqueiro, batendo com o cacete no cabo da faca, abriu ao meio a criação morta.

            Mas Pedro, que fitava a estrada, o interrompeu:

             - Olha, pai!

            Um homem de mescla azul vinha para eles em grandes passadas. Agitava os braços em fúria, aos berros:

            - Cachorro! Ladrão! Matar minha cabrinha! Desgraçado!

            Chico Bento, tonto, desnorteado, deixou a faca cair e, ainda de cócoras, tartamudeava explicações confusas.

            O homem avançou, arrebatou-lhe a cabra e procurou enrolá-la no couro.

            Dentro da sua perturbação, Chico Bento compreendeu apenas que lhe tomavam aquela carne em que seus olhos famintos já se regalavam, da qual suas mãos febris já tinham sentido o calor confortante.

            E lhe veio agudamente à lembrança Cordulina exânime na pedra da estrada... o Duquinha tão morto que já nem chorava...

             Caindo quase de joelhos, com os olhos vermelhos cheios de lágrimas que lhe corriam pela face áspera, suplicou, de mãos juntas:

            - Meu senhor, pelo amor de Deus! Me deixe um pedaço de carne, um taquinho ao menos, que dê um caldo para a mulher mais os meninos! Foi pra eles que eu matei! já caíram com a fome!...

            - Não dou nada! Ladrão! Sem-vergonha! Cabra sem-vergonha!

            A energia abatida do vaqueiro não se estimulou nem mesmo diante daquela palavra.

             Antes se abateu mais, e ele ficou na mesma atitude de súplica.

             E o homem disse afinal, num gesto brusco, arrancando as tripas da criação e atirando-as para o vaqueiro:

            - Tome! Só se for isto! A um diabo que faz uma desgraça como você fez, dar-se tripas é até demais!...

             A faca brilhava no chão, ainda ensanguentada, e atraiu os olhos de Chico Bento.

            Veio-lhe um ímpeto de brandi-la e ir disputar a presa, mas foi ímpeto confuso e rápido. Ao gesto de estender a mão, faltou-lhe o ânimo.

            O homem, sem se importar com o sangue, pusera no ombro o animal sumariamente envolvido no couro e marchava para a casa cujo telhado vermelhava, lá além.

             Pedro, sem perder tempo, apanhou o fato que ficara no chão e correu para a mãe.

            Chico Bento ainda esteve uns momentos na mesma postura, ajoelhado.

            E antes de se erguer, chupou os dedos sujos de sangue, que lhe deixaram na boca um gosto amargo de vida.

                                                             (O Quinze, Rachel de Queiroz)

1. Chico Bento e sua família são retirantes. Qual é a condição física deles no momento retratado pelo texto? Comprove sua resposta com trechos do texto.

Eles estavam degradados fisicamente, conforme comprovam os trechos “Cordulina, que vinha quase cambaleando”, ‘O Duquinha, também só osso e pele”.

2. Chico Bento, antes da seca, não era vagabundo nem bandido; era um trabalhador rural. Levante hipóteses:

a) Como deve ter se sentido ao ser xingado pelo proprietário da cabra?

Deve ter se sentido humilhado, atingido moralmente, pois não era ladrão; roubara por necessidade.

b) Por que não reagiu aos insultos?

Por reconhecer as razões do homem e, talvez, por pensar na família.

3. Ao ver que sua presa seria levada, Chico Bento chegou a sentir vontade de lutar por ela com sua faca, “mas foi ímpeto confuso e rápido. Ao gesto de estender a mão, faltou-lhe o ânimo”. Embora esse seja apenas um fragmento da obra, é possível extrair algumas conclusões importantes desse fato.

a) O sertanejo, no texto, é visto como um ser resignado à sua condição ou como um ser transformador, responsável por seus próprios destinos?

Resignado. Exausto e desesperançoso, Chico Bento sente-se sem ânimo para lutar contra sua sorte.

b) Nesse fragmento, como é vista a condição de miséria e até de eventual violência (que acabou não se concretizando) em que vivem as personagens: como fatalidade ou como resultado de políticas governamentais ou de relações sociais inadequadas?

Como fatalidade; no episódio não há nenhuma referência a fatores de ordem social, também responsáveis pela condição das personagens.

4. O Quinze é um bom exemplo de como os romancistas da década de 1930 lidam com a linguagem literária. Observe a linguagem empregada no texto quanto a: vocabulário (mais culto ou mais popular, regionalismos), construções sintáticas (mais prolixas ou mais próximas da fala), períodos (longos ou curtos), etc. Em seguida, caracterize-a.

A linguagem é culta, porém direta, com vocabulário acessível, por vezes incluindo algum termo regional. Os períodos são curtos e buscam maior proximidade com a linguagem oral.

 

        BONS ESTUDOS!

quinta-feira, 24 de novembro de 2022

Evocação do Recife, de Manuel Bandeira: exercícios resolvidos

 


    O poema a seguir integra a obra Libertinagem, na qual Manuel Bandeira incorpora vários temas ligados à cultura popular e ao folclore. O poema, ao mesmo tempo que tematiza a infância, faz uma descrição da cidade de Recife no fim do século XIX.

Evocação do Recife

Recife
Não a Veneza americana
Não a Mauritssatd dos armadores das Índias Ocidentais
Não o Recife dos Mascates
Nem mesmo o Recife que aprendi a amar depois —
Recife das revoluções libertárias
Mas o Recife sem história nem literatura
Recife sem mais nada
Recife da minha infância

A Rua da União onde eu brincava de chicote-queimado e partia as vidraças 

                                                [da casa   de Dona Aninha  Viegas                                                                                                                                                     
Totônio Rodrigues era muito velho e botava o pincené na ponta do nariz
Depois do jantar as famílias tomavam a calçada com cadeiras, mexericos,

                                                    [ namoros, risadas
A gente brincava no meio da rua
Os meninos gritavam:

Coelho sai!
Não sai!

A distância as vozes macias das meninas politonavam:

Roseira dá-me uma rosa
Craveiro dá-me um botão
(Dessas rosas muita rosa
Terá morrido em botão...)

De repente
nos longes da noite
um sino

Uma pessoa grande dizia:
Fogo em Santo Antônio!
Outra contrariava: São José!
Totônio Rodrigues achava sempre que era São José.
Os homens punham o chapéu saíam fumando
E eu tinha raiva de ser menino porque não podia ir ver o fogo

Rua da União...
Como eram lindos os nomes das ruas da minha infância
Rua do Sol
(Tenho medo que hoje se chame do Dr. Fulano de Tal)
Atrás de casa ficava a Rua da Saudade...
... onde se ia fumar escondido
Do lado de lá era o cais da Rua da Aurora...
... onde se ia pescar escondido
Capiberibe
— Capibaribe
Lá longe o sertãozinho de Caxangá
Banheiros de palha
Um dia eu vi uma moça nuinha no banho
Fiquei parado o coração batendo
Ela se riu
Foi o meu primeiro alumbramento

Cheia! As cheias! Barro boi morto árvores destroços redomoinho sumiu
E nos pegões da ponte do trem de ferro os caboclos destemidos em jangadas

                                                          [ de bananeiras

Novenas
Cavalhadas

Eu me deitei no colo da menina e ela começou a passar a mão nos meus cabelos

Capiberibe
— Capibaribe

Rua da União onde todas as tardes passava a preta das bananas com o

                              [ xale vistoso de pano da Costa
E o vendedor de roletes de cana
O de amendoim
que se chamava midubim e não era torrado era cozido
Me lembro de todos os pregões:
Ovos frescos e baratos
Dez ovos por uma pataca
Foi há muito tempo...
A vida não me chegava pelos jornais nem pelos livros
Vinha da boca do povo na língua errada do povo
Língua certa do povo
Porque ele é que fala gostoso o português do Brasil
Ao passo que nós
O que fazemos
É macaquear
A sintaxe lusíada
A vida com uma porção de coisas que eu não entendia bem
Terras que não sabia onde ficavam
Recife...
Rua da União...
A casa de meu avô...
Nunca pensei que ela acabasse!
Tudo lá parecia impregnado de eternidade
Recife...
Meu avó morto.
Recife morto, Recife bom, Recife brasileiro como a casa de meu avô.

 

1. Na 1ª estrofe do poema, o eu lírico delimita o Recife que evoca. Não é o Recife histórico nem o Recife turístico ou cultural.

a) Qual é o Recife que ele evoca? Destaque um verso que justifique sua resposta.

É o Recife que habita a sua memória: “Recife da minha infância”.

b) O retrato do Recife evocado é feito, portanto, de modo objetivo ou subjetivo?

De modo subjetivo.

2. Observe estes versos do poema:

“Uma pessoa grande dizia: / Fogo em Santo Antônio!”
“(Tenho medo que hoje se chame do Dr. Fulano de Tal)”

Com base nesses versos, responda: O eu lírico, ao evocar o passado, coloca-se no texto como adulto ou como criança? Justifique.

Há uma mistura de perspectiva: no primeiro e segundo versos, o eu lírico revive cenas do passado, como se fosse criança outra vez; no terceiro verso, deixa transparecer a visão crítica do adulto.

3. Procurando dessacralizar a poesia, os modernistas aproximam-na das coisas simples, como o cotidiano e a cultura popular. Identifique no texto o aproveitamento desses elementos.

As brincadeiras de roda com suas cantigas infantis, os pregões dos vendedores, as crenças e as festas populares, os nomes de ruas, etc.

4. Manuel Bandeira nunca aderiu às novidades modernistas como modismo. Ao contrário, empregava-as com critério, sabendo extrair efeitos delas. Observe a irregularidade métrica e a pontuação destes versos:

“Os homens punham o chapéu saíam fumando”

“Cheia! As cheias! Barro boi morto árvores destroços redomoinho sumiu”

Buscando estabelecer relações entre a forma e o conteúdo, responda:

a) Por que a ausência de pontuação torna o sentido desses dois versos mais preciso?

No primeiro verso, a ausência de pontuação sugere a rapidez das ações; no segundo verso, a violência das águas durante as cheias.

b) Observe o tamanho do segundo desses versos. Relacionando-o com o conteúdo do verso (as cheias), o que justificaria esse tamanho?

A enumeração caótica, num único verso, dos vários elementos arrastados pela água imita formalmente o caos promovido pelas cheias, que arrastam tudo de uma só vez.

5. Assim como Mário e Oswald, Bandeira também se preocupou com a necessidade de criar uma nova língua literária. De acordo com o texto:

a) Qual é a “língua certa do povo”?

É a língua espontânea e natural falada pelo povo.

b) A quem possivelmente se refere o pronome nós dos versos “Ao passo que nós / o que fazemos”?

Às pessoas cultas: escritores, leitores, professores, etc.

c) É possível afirmar que Bandeira pôs em prática no poema essa concepção de língua? Justifique com palavras ou expressões do texto.

Sim, pois o poema apresenta vocabulário e construções sintáticas simples, além de empregar palavras do uso popular, como “midubim” e “macaquear”.

6. Responda:

a) Por que o eu lírico afirma “Meu avô morto / Recife morto [...]”?

Porque com a morte do avô – uma das figuras centrais da mitologia da infância do poeta -, ocorre também a morte do Recife que vivia na memória do eu lírico.

b) Que tipo de sentimento revela o eu lírico em relação ao Recife de sua infância?
Melancolia, nostalgia, tristeza.

 

BONS ESTUDOS!


sexta-feira, 12 de agosto de 2022

Coerência e Coesão no processamento do texto - Exercícios com gabarito - PARTE III

 

Descritor 8 Estabelecer relação entre a tese e os argumentos oferecidos para sustentá-la.

 

 

QUESTÃO 1

 

Brincadeira retrô

Me lembro bem de quando era pequena e do quanto minha imaginação era fértil. Eu fui daque- las crianças que davam arrepios nos pais por conta das brincadeiras mirabolantes: a cama de casal que virava navio pirata, o sofá da sala que virava palco de teatro com direito a cortina de lençol e tudo mais... Toda vez que começava a me animar minha avó dizia: “Lá vem essa menina inventando moda”. Hoje vejo que esse era o jeito de brincar das crianças de antigamente. Não havia toda essa parafernália eletrônica, que toca música, anda, fala e não deixa nenhum espaço para a imaginação. Precisávamos inventar as nossas brincadeiras. Criança moderna não sabe brincar sozinha, tem sempre a babá, o computador, o DVD... Hoje tento incentivar meu filho a brincar assim também. Não é que eu vá jogar todos os brinquedos dele fora, mas com certeza ele vai aprender a se divertir com muito menos. Dá mais trabalho, faz mais bagunça, mas é infinitamente mais divertido.

POMÁRICO, Veri. Revista Gol, Editora Trip: s/l. s/d.





 

A autora deste texto defende que:

(A)            as brincadeiras das crianças de antigamente eram divertidas.

(B)            as brincadeiras de antigamente eram mais criativas que as atuais.

(C)           as maneiras de as crianças de hoje brincar devem ser aceitas.

(D)           as crianças devem brincar com parafernálias eletrônicas.

 

            QUESTÃO 2

 

            Está certo que todos os adultos mantêm uma parcela de infância que precisa ser superada dia- riamente, e essa é a tarefa árdua do exercício de maturidade. Mas parece que atualmente essa nossa cota infantil, ao invés de ser superada, tem sido cultivada com esmero. Além disso, o julgamento do outro não mais nos incomoda nem importa. Não nos envergonhamos mais de nossos descuidos, nada mais parece nos constranger. O aviso “Sorria, você está sendo filmado” ganhou, portanto, um tom irônico. Adolescentes são tentados a fazer caretas e gestos obscenos quando sabem que alguém os observa. À frente de uma câmera, então, eles se superam e perdem qualquer pudor. É uma maneira de dizer “Eu sou assim, o que você tem com isso?”. É um modo de enfrentar com insolência o mundo adulto, do qual acabaram de escapar e para o qual se encaminham.

            Pois parece que é dessa maneira que os adultos têm se comportado publicamente. Não nos importamos mais aliás, parece que nos orgulhamos disso de expor nossas piores qualidades e características aos outros. O roxo, uma cor que foi associada à vergonha na expressão “roxo de vergonha”, passou recentemente para nossa história como cor que simboliza o orgulho que temos de nossas atitudes irrefletidas e muitas vezes violentas quando um presidente exclamou em um discurso que “tinha aquilo roxo”. Uma publicidade veiculada pela TV, ao mostrar tudo o que se pode fazer com o dedo indicador, mostra uma criança com o dedo no nariz enquanto o narrador diz “limpar o salão”.

            É isso: parece que não queremos mais mostrar o que temos de melhor aos outros e sim o que temos de pior. Isso mostra um grande desprezo pelos outros, não? Basta assistir a algumas cenas do programa “BBB” para fazer essa constatação. Mas não nos iludamos: isso não ocorre apenas nesse programa, mas no cotidiano de nossa vida pública. Será que concluímos que o que nos une e o que nos equipara na convivência pública são nossas mazelas?

 

                                             ROSELY SAYÃO

Disponível em: <https://www1.folha.uol.com.br/fsp/equilibrio/>.

 

A autora do texto defende a tese de que não há mais vergonha de expormos nossas piores qualidades e características aos outros. O argumento que melhor sustenta seu ponto de vista está expresso na alternativa:

(A)     cota de infantilidade que temos parece está sendo cultivada com esmero.

(B)     A cor roxa passou a simbolizar o orgulho de nossas nações irrefletidas.

(C)    Adultos comportam-se publicamente como adolescente sonolento.

(D)    Adolescentes têm enfrentado com insolência o mundo adulto.

 

 

QUESTÃO 3

Minha fase pessimista

Ana Paula Padrão

A residência do sr. Trump fica na Quinta Avenida, agora parcialmente obstruída à passagem de pedestres. Um transtorno para os nova-iorquinos e uma distração para os turistas. A quantidade de gente fazendo selfie pra enfeitar as redes sociais – eu incluída – é constrangedora. Passei por ali por acaso, a caminho de uma reportagem e segui meu passo intrigada. Me perguntei, de novo, porque a maioria das mulheres americanas brancas, com baixa escolaridade, votou nele. Por que são conservadoras? Por que ele prometeu empregos? Sei lá. Me dá uma tristeza profunda.

Há cem anos as mulheres conseguiram o direito ao voto nos EUA. Naquela época, as sufragettes, como ficaram conhecidas as que lutaram para ir às urnas, eram objeto de ódio, sarcasmo e piadas machistas de todo tipo. Elas foram, de alguma maneira, as pioneiras do movimento feminista. Não creio que mulher tenha de obrigatoriamente votar em mulher. Mas votar no Trump? Com todo respeito, ai, que desânimo.

[...] Estou numa fase pessimista, vou logo avisando. Quando passei pela Quinta Avenida e vi aquela multidão de wanna be blogueiros e aquele mundo de jornalistas debaixo de neve na frente da Trump Tower, dei graças aos céus por ter escapado dos plantões jornalísticos de fim de ano. E das retrospectivas de 2016. De verdade, eu não saberia por onde começar.

Pela eleição do sr. Trump? Não vamos dar a ele toda essa importância. Não que ele não seja importante, mas para que naufragar em tanta realidade logo no começo do ano? Pelo impeachment de Dilma? Pela Olimpíada do Rio? Pela Paralimpíada? Pode ser. Mas foi mesmo em 2016? Eita ano congestionado de notícia. Quando chego na Rua 48, dez quadras mais tarde, concluo que minha retrospectiva valeria o nome se começasse pela queda do avião da Chapecoense. Acredito que apenas uma tragédia desse porte tenha força para unir os desiguais. Provavelmente prestarei contas no dia do juízo final, mas meu lado mau começa a achar que 2017 poderia ter menos polêmicas e mais unanimidades. Quem sabe a humanidade ainda teria jeito.

 

Disponível em: <https://istoe.com.br/minha-fase-pessimista/>.

Acesso em: 12 nov. 2020.

 

Dos argumentos que a autora utiliza, o que melhor apoia seu ponto de vista está expresso na alternativa:

(A)            As sufraggetes foram objeto de ódio, sarcasmo e piadas machista de todo o tipo.

(B)            A quantidade de pessoas fazendo selfies na quinta avenida, em Nova Iorque, para enfeitar as redes sociais eram constrangedoras.

(C)           O ano de 2016 foi um ano congestionado de notícias polêmicas que não valem uma retrospectiva.

(D)           O ano de 2017 poderia ser um ano com menos polêmica e com mais unanimidade.

 

QUESTÃO 4

A poluição do mundo

Júlio José Chiavenato

Os grandes países industriais são os mais poluídos do mundo. Em Tóquio vende-se oxigênio nas ruas centrais. É comum os japoneses comprarem uma dose e enfiarem o nariz na “garrafinha”, recuperando-se do veneno que são obrigados a respirar. Os guardas de trânsito, intoxicados pelos gases dos automóveis, têm postos de abastecimento especiais nas esquinas.

Apesar da propaganda que apresenta o centro da Europa como um oásis verde entre enormes fábricas, quem lê jornal sabe o que acontece com o Reno: um rio totalmente morto e mortífero, carregando resíduos químicos por milhares de quilômetros, contaminando os depósitos de água potável de vários países.

Metade da população holandesa bebe a água do Rio Reno, que é o maior esgoto do mundo e o receptor de inseticidas das fábricas alemães. Seus peixes são proibidos para o consumo, por- que os detritos industriais com que se “alimentam” tornam sua carne fétida.

E os Estados Unidos, pátria do capitalismo moderno, louvado pelo rigor de suas leis, são – e isto seus próprios técnicos afirmam – o país mais poluído do planeta. Além disso, são os maiores exportadores de poluição: 40% da contaminação da Terra é provocada por suas indústrias, segundo informação de Philip Bart, ecologista e redator da Internation Review.

Disponível em: <https://brainly.com.br/tarefa/13393495>.

Acesso em: 12 nov. 2020.

Neste texto, o autor defende a tese de que os países industriais são os mais poluídos do mundo. Marque a alternativa que apresenta o argumento correto para a sustentação desta tese.

(A)               Nas ruas centrais de Tóquio vende-se oxigênio.

(B)           Os Estados Unidos são louvados pelo rigor de suas leis.

(C)          O centro da Europa é apresentado como um oásis verde.

(D)         Na Holanda, metade da população bebe água do Rio Reno.

 

QUESTÃO 5

Escrevendo o futuro

Fernando Brant

Ler, compreender, escrever. O estudante capaz de dominar esses três momentos está pronto para desenvolver com sucesso sua vida. Essa é uma das carências de nosso país, que carrega nas costas milhões de analfabetos e outros tantos que, precariamente alfabetizados, leem mas não percebem os significados, não têm condição de usar o que apreenderam mal. Chegaram à porta do conhecimento, mas não alcançam abri-la para desfrutar as maravilhas do mundo do saber e da comunicação. Anísio Teixeira, educador perseguido por ditaduras, já dizia, em 1920, da dificuldade que tinha o Brasil de caminhar na direção do futuro se a Educação não fosse prioridade nossa. Ao longo dos anos, muita gente continua batalhando para transformar a realidade dos brasileiros.

Disponível em: <https://www.escrevendoofuturo.org.br/ conteudo/biblioteca/nossas-publicacoes/revista/paginas

-literarias/artigo/1068/escrevendo-o-futuro>.

Acesso em: 12 nov. 2020.

Qual argumento melhor sustenta a tese de que o Brasil é carente de estudantes capazes de ler, compreender e escrever?

(A)  “O estudante capaz de dominar esses três momentos está pronto para desenvolver com sucesso sua vida.’’

(B)  “Anísio Teixeira dizia da dificuldade que tinha o Brasil de caminhar na direção do futuro’’

(C)  “[...] carrega nas costas milhões de analfabetos e outros tantos que, precariamente alfabetizados leem.’’

(D) “Ao longo dos anos, muita gente continua batalhando para transformar a realidade dos brasileiros.’’

 

 QUESTÃO 6

Descritor 7 – Identificar a tese de um texto.

 


Título

     Uma epidemia, como Albert Camus sabia tão bem, revela toda a doença de uma sociedade. A doença que esteve sempre lá, respirando nas sombras (ou nem tão nas sombras assim), manifesta sua face horrenda. Foi assim no Brasil na semana passada. Era uma suspeita de ebola, fato suficiente, pela letalidade do vírus, para exigir o máximo de seriedade das autoridades de saúde, como aconteceu. Descobrimos, porém, a deformação causada por um vírus que nos consome há muito mais tempo, o da xenofobia. E, como o outro, o “estrangeiro”, a “ameaça”, era africano da Guiné, exacerbada por uma herança escravocrata jamais superada. O racismo no Brasil não é passado, mas vida cotidiana conjugada no presente. A peste não está fora, mas dentro de nós.

     Foi ela, a peste dentro de nós, que levou à violação dos direitos mais básicos do homem sobre o qual pesava uma suspeita de ebola. Contrariando a lei e a ética, seu nome foi exposto. Seu rosto foi exposto. O documento em que pedia refúgio foi exposto. Ele não foi tratado como um homem, mas como o rato que traz a peste para essa Oran chamada Brasil. Deste crime, parte da imprensa, se tiver vergonha, se envergonhará.

          O ebola não parece ser um problema quando está na África, contido entre fronteiras. Lá é destino. O ebola só é problema, como escreveu o pesquisador francês Bruno Canard, porque o vírus saiu do lugar em que o Ocidente gostaria que ele ficasse. “A militarização da resposta ao ebola, que com a anuência do Conselho de Segurança das Nações Unidas, em setembro último, passou da Organização Mundial da Saúde a uma Missão da ONU, revela que a grande preocupação da comunidade internacional não é a erradicação da doença, mas a sua contenção geográfica”, reforça Deisy Ventura.

Disponível em: <https://brasil.elpais.com/brasil/2014/10/13/ opinion/1413206886_964834.html>. Acesso em: 12 nov. 2020.

 

Qual dos trechos apresenta a tese do texto?

(A)            “O ebola não parece ser um problema quando está na Africa, contido entre fronteiras. Lá é destino.”

(B)            “O racismo no Brasil não é passado, mas vida cotidiana conjugada no presente. A peste não está fora, mas dentro de nós.’’

(C)           “Era uma suspeita de ebola, fato suficiente, pela letalidade do vírus, para exigir o máximo de seriedade das autoridades de saúde, como aconteceu.’’

(D)           “O documento em que pedia refúgio foi exposto. Ele não foi tratado como um homem, mas como um rato que traz a peste para essa Oran chamada Brasil.’’

 

QUESTÃO 7

 

Gente invisível

Danielle L. de Souza

Infelizmente, vivemos num mundo de valores, em que as pessoas são vistas pelo que têm, e não pelo que são. Já vi uma pessoa ignorar um gari, mas nunca havia pensado como esses trabalhadores se sentem invisíveis e excluídos da sociedade. Se isso não é preconceito, então eu não sei o que é. Falo todos os dias com minha empregada ou com qualquer uniformizado. Isso nunca me matou, só me fez descobrir que, por trás de um simples empregado, há, muitas vezes, uma grande pessoa.

Disponível em: <http://revistaepoca.globo.com/ Epoca/0,6993,EPT787092-2119-2,00.html>.

Acesso em: 12 nov. 2020.

 

Assinale o trecho que expressa a opinião central da leitora.

(A)            “Infelizmente, vivemos num mundo de valores, em que as pessoas são vistas pelo que têm, e não pelo que são.’’

(B)            “Se isso não é preconceito, então eu não seio que é. Falo todos os dias com minha empregada ou com qualquer uniformizado.’’

(C)           “Isso nunca me matou, só me fez descobrir que, por trás de um simples empregado, há, muitas vezes, uma grande pessoa.”

(D)           “Já vi uma pessoa ignorar um gari, mas nunca havia pensado como esses trabalhadores se sentem invisíveis e excluídos da sociedade.’’

 

                                                                       BONS ESTUDOS!