1. (UFU-MG) Leia o poema seguinte e assinale a alternativa correta:
Filhos
A meu filho Marcos
Daqui escutei
quando eles
chegaram rindo
e correndo
entraram
na sala
e logo
invadiram também
o escritório
(onde eu trabalhava)
num alvoroço
e rindo e correndo
se foram
com sua alegria
se foram
Só então
me perguntei
por que
não lhes dera
maior
atenção
se há tantos
e tantos
anos
não os via
crianças
já que
agora
estão os três
com mais
de trinta anos.
Ferreira Gullar. Melhores poemas.
a) O poeta Ferreira Gullar é um escritor contemporâneo que participou de vários movimentos de restauração da poesia, o que significa renovar sua estrutura, sua linguagem. Neste poema, a linguagem prosaica, os versos livres e a emoção espontânea são conquistas do concretismo.
b) Ferreira Gullar passa por várias experiências poéticas, encontrando a razão do poema na comoção lírica. Em acordo com os preceitos da essência lírica, o poema apresenta distanciamento e objetividade do sujeito lírico com os fatos descritos.
c) Em entrevista à revista Língua portuguesa (São Paulo: Editora Segmento, 2006, n. 5), o poeta declara que esse poema é fruto de uma circunstância, de um impulso, pois sonhou com a situação descrita nele. Desta forma, ao descrever o sonho, pode-se afirmar que o gênero épico prevalece nesse poema.
d) O olhar do poeta Ferreira Gullar contempla grandes acontecimentos universais, pequenos fatos do cotidiano, cenas da vida doméstica, não raro, imprimindo sobre esses episódios a consciência da efemeridade da vida. Nesse poema, a lembrança de um passado familiar provoca a reflexão dessa consciência.
2. (Vunesp) A questão a seguir toma por base um poema de Tomás Antônio Gonzaga (1744-1810).
18
Não vês aquele velho respeitável,
que à muleta encostado,
apenas mal se move e mal se arrasta?
Oh! quanto estrago não lhe fez o tempo,
o tempo arrebatado,
que o mesmo bronze gasta!
Enrugaram-se as faces e perderam
seus olhos a viveza:
voltou-se o seu cabelo em branca neve;
já lhe treme a cabeça, a mão, o queixo,
nem tem uma beleza
das belezas que teve.
Assim também serei, minha Marília,
daqui a poucos anos,
que o ímpio tempo para todos corre.
Os dentes cairão e os meus cabelos.
Ah! sentirei os danos,
que evita só quem morre.
Mas sempre passarei uma velhice
muito menos penosa.
Não trarei a muleta carregada,
descansarei o já vergado corpo
na tua mão piedosa,
na tua mão nevada.
As frias tardes, em que negra nuvem
os chuveiros não lance,
irei contigo ao prado florescente:
aqui me buscarás um sítio ameno,
onde os membros descanse,
e ao brando sol me aquente.
Apenas me sentar, então, movendo
os olhos por aquela
vistosa parte, que ficar fronteira,
apontando direi: - Ali falamos,
ali, ó minha bela,
te vi a vez primeira.
Verterão os meus olhos duas fontes,
nascidas de alegria;
farão teus olhos ternos outro tanto;
então darei, Marília, frios beijos
na mão formosa e pia,
que me limpar o pranto.
Assim irá, Marília, docemente
meu corpo suportando
do tempo desumano a dura guerra.
Contente morrerei, por ser Marília
quem, sentida, chorando
meus baços olhos cerra.
Tomás Antônio Gonzaga. Marilia de Dirceu e mais poesias.
Lisboa: Livraria Sá da Costa Editora, 1982.
A leitura atenta deste poema do livro Marília de Dirceu revela que o eu lírico:
a) sente total desânimo perante a existência e os sentimentos.
b) aceita com resignação a velhice e a morte amenizadas pelo amor.
c) está em crise existencial e não acredita na durabilidade do amor.
d) protesta ao Criador pela precariedade da existência humana.
e) não aceita de nenhum modo o envelhecimento e prefere morrer ainda jovem.
3. (Mack-SP)
Reinando Amor em dois peitos,
tece tantas falsidades,
que, de conformes vontades,
faz desconformes efeitos.
Igualmente vive em nós;
mas, por desconcerto seu,
vos leva, se venho eu,
me leva, se vindes vós.
Camões
No texto, o eu lírico:
a) chama a atenção do leitor para as artimanhas que as mulheres apaixonadas costumam tramar a fim de conquistar os homens.
b) dirige-se ao deus Amor, manifestando seu descontentamento com relação às falsas atitudes da amada.
c) manifesta poeticamente a ideia de que o Amor, atendendo a diferentes vontades, produz diferentes efeitos.
d) declara que, embora o amor esteja presente em todas as pessoas, nem todos o aceitam, fato que gera desentendimentos dolorosos.
e) dirige-se à pessoa amada para expressar seu entendimento a respeito dos aspectos contraditórios do sentimento amoroso.
4. (UERJ)
Os poemas
Os poemas são pássaros que chegam
não se sabe de onde e pousam
no livro que lês.
Quando fechas o livro, eles alçam voo
como de um alçapão.
Eles não têm pouso
nem porto
alimentam-se um instante em cada par de mãos
e partem.
E olhas, então, essas tuas mãos vazias,
no maravilhado espanto de saberes
que o alimento deles já estava em ti...
MÁRIO QUINTANA. Poesia completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2005
Eles não têm pouso
nem porto (v. 6-7)
Os versos acima podem ser lidos como uma pressuposição do autor sobre o texto literário.
Essa pressuposição está ligada ao fato de que a obra literária, como texto público, apresenta o seguinte traço:
a) é aberta a várias leituras.
b) provoca desejo de transformação.
c) integra experiências de contestação.
d) expressa sentimentos contraditórios.
5. (Unicamp-SP) Leia o poema, de Manuel António Pina, importante nome da lírica portuguesa contemporânea:
Agora é
Agora é diferente
Tenho o teu nome o teu cheiro
A minha roupa de repente
ficou com o teu cheiro
Agora estamos misturados
No meio de nós já não cabe o amor
Já não arranjamos
lugar para o amor
Já não arranjamos vagar
para o amor agora
isto vai devagar
Isto agora demora
Manuel António Pina, Poesia Reunida (1974-2001). Lisboa: Assirio & Alvim, 2001, p. 49.
a) O poema trata de uma transformação. Explique-a.
O poema fala da transformação do amor existente entre duas pessoas. Ao dizer o que ocorre "agora" com a relação de amor ("Agora estamos misturados/No meio de nós já não cabe o amor"), o eu lírico aponta o desgaste provocado pelo tempo, que tornou a relação sem espaço para o amor e tediosa ("isto vai devagar"). No final, o tempo parece não passar mais ("Isto agora demora").
b) Que palavra marca essa transformação?
A palavra "agora", que invoca uma situação anterior aquela que se vive no momento.
c) Qual a diferença introduzida por essa transformação no tratamento convencional dado ao tema?
O amor costuma ser retratado de forma idealizada, como um sentimento puro, livre de aspectos negativos. No poema, o eu lírico mostra que o amor pode se desgastar com o tempo e acabar.
6. (Insper-SP)
Falar e dizer
Não é possível que portentos não tenham ocorrido
Ou visões ominosas e graves profecias
Quando nasci.
Então nasce o chamado
Herdeiro das superfícies e das profundezas então
Desponta o sol
E não estremunha aterrado o mundo?
Assim à idade da razão
Vazei os olhos cegos dos arúspices e,
Fazendo rasos seus templos devolutos,
Desde então eu designo no universo vão
As coisas e as palavras plenas.
Só
Com elas
Recôndito e radiante ao sopro dos tempos
Falo e digo
Dito e decoro
O caos arreganhado a receber-me incontinente.
Antônio Cícero
Arúspice: Sacerdote romano que fazia presságios consultando as entranhas das vítimas.
Nos versos, a postura assumida pelo eu lírico em relação ao mundo revela:
a) confiança no poder da palavra, capaz de organizar o caos do universo em que o eu lírico se insere.
b) aceitação de seu anonimato, visto que seus dons não estão ao alcance de serem compreendidos no universo.
c) sentimento de inferioridade diante da incerteza de poder nomear os acontecimentos do universo.
d) insegurança em relação à tarefa a que se sente destinado: organizar o caos do universo.
e) revolta por perceber sua própria incapacidade de alterar o mundo à sua volta.
7. (Vunesp) A questão a seguir aborda um poema de Raul de Leoni (1895-1926).
A alma das cousas somos nós...
Dentro do eterno giro universal
Das cousas, tudo vai e volta à alma da gente,
Mas, se nesse vaivém tudo parece igual
Nada mais, na verdade,
Nunca mais se repete exatamente...
Sim, as cousas são sempre as mesmas na corrente
Que no-las leva e traz, num círculo fatal;
O que varia é o espírito que as sente
Que é imperceptivelmente desigual,
Que sempre as vive diferentemente,
E, assim, a vida é sempre inédita, afinal...
Estado de alma em fuga pelas horas,
Tons esquivos e trêmulos, nuanças
Suscetíveis, sutis, que fogem no Íris
Da sensibilidade furta-cor...
E a nossa alma é a expressão fugitiva das cousas
E a vida somos nós, que sempre somos outros!...
Homem inquieto e vão que não repousas!
Para e escuta:
Se as cousas têm espírito, nós somos
Esse espírito efêmero das cousas,
Volúvel e diverso,
Variando, instante a instante, intimamente,
E eternamente,
Dentro da indiferença do Universo!...
Luz mediterrânea, 1965.
Uma leitura atenta do poema permite concluir que seu título representa:
a) a negação dos argumentos defendidos pelo eu lírico.
b) a confirmação do estado de alma disfórico do eu lírico.
c) a síntese das ideias desenvolvidas pelo eu lírico.
d) o reconhecimento da supremacia do homem no mundo.
e) uma afirmação prévia da incapacidade do homem.
8. (Vunesp) A questão toma por base um fragmento de uma peça do teatrólogo Guilherme Figueiredo (1915- 1997).
A raposa e as uvas
(Casa de Xantos, em Samos. Entradas à D.. E., e F. Um gongo. Uma mesa. Cadeiras. Um "clismos". Pelo pórtico, ao fundo, vê-se o jardim. Estão em cena Cleia, esposa de Xantós, e Melita, escrava. Melita penteia os cabelos de Cleia.)
MELITA:- (Penteando os cabelos de Cleia.) Então Rodópis contou que Crisipo reuniu os dis- cípulos na praça, apontou para o teu marido e exclamou: "Tens o que não perdeste". Xantós respondeu: "E certo". Crisipo continuou: "Não perdeste chifres". Xantós concordou: "Sim". Crisipo finalizou: "Tens o que não perdeste; não perdeste chifres, logo os tens".
(Cleia ri.) Todos riram a valer.
CLEIA:-É engenhoso. É o que eles chamam sofisma. Meu marido vai à praça para ser insultado pelos outros filósofos?
MELITA:- Não; Xantós é extraordinariamente inteligente... No meio do riso geral, disse a Crisipo: "Crisipo, tua mulher te engana, e no entanto não tens chifres: o que perdeste foi a vergonha!" E aí os discípulos de Crisipo e os de Xantós atiraram-se uns contra os outros...
CLEIA:- Brigaram? (Assentimento de Melita.) Como é que Rodópis soube disto?
MELITA: - Ela estava na praça.
CLEIA: Vocês, escravas, sabem mais do que se passa em Samos do que nós, mulheres livres...
MELITA:-As mulheres livres ficam em casa. De certo modo são mais escravas do que nós.
CLEIA:-É verdade. Gostarias de ser livre?
MELITA:-Não, Cleia. Tenho conforto aqui, e todos me consideram. É bom ser escrava de um homem ilustre como teu marido. Eu poderia ter sido comprada por algum mercador, ou algum soldado, e no entanto tive a sorte de vir a pertencer a Xantós.
CLEIA:- Achas isto um consolo?
MELITA: - Uma honra. Um filósofo, Cleia!
CLEIA: - Eu preferia que ele fosse menos filósofo e mais marido. Para mim os filósofos são pessoas que se encarregam de aumentar o número dos substantivos abstratos.
MELITA:- Xantós inventa muitos?
CLEIA: - Nem ao menos isto. E aí é que está o trágico: é um filósofo que não aumenta o voca- bulário das controvérsias. Já terminaste?
MELITA: - Quase. É bom pentear teus cabelos: meus dedos adquirem o som e a luz que eles têm. Xantós beija os teus cabelos? (Muxoxo de Cleia.) Eu admiro teu marido.
CLEIA: - Por que não dizes logo que o amas? Gostarias bastante se ele me repudiasse, te tornasse livre e se casasse contigo...
MELITA: - Não digas isto... Além do mais, Xantós te ama...
CLEIA: - À sua maneira. Faço parte dos bens dele, como tu, as outras escravas, esta casa...
MELITA:-Sempre que viaja te traz presentes.
CLEIA: Não é o amor que leva os homens a dar presentes às esposas: é a vaidade: ou o remorso.
MELITA:- Xantós é um homem ilustre.
CLEIA: - É o filósofo da propriedade: "Os homens são desiguais: a cada um toca uma dádiva ou um castigo". É isto democracia grega... E o direito que o povo tem de escolher o seu tirano: é o direito que o tirano tem de determinar: deixo-te pobre; faço-te rico; deixo-te livre; faço-te escravo. E o direito que todos têm de ouvir Xantós dizer que a injustiça é justa, que o sofrimento é alegria, e que este mundo foi organizado de modo a que ele possa beber bom vinho, ter uma bela casa, amar uma bela mulher. Já terminaste?
MELITA: - Um pouco mais, e ainda estarás mais bela para o teu filósofo.
CLEIA: O meu filósofo... Os filósofos são - sempre criaturas cheias demais de palavras...
*Espécie de cama para recostar-se.
(Guilherme Figueiredo, Um deus dormiu lá em casa, 1964.)
A leitura deste fragmento da peça A raposa e as uvas revela que a personagem Cleia:
a) aprecia, orgulhosa, Xantós como homem e como filósofo.
b) tem bastante orgulho pelas vitórias do marido nos debates.
c) manifesta desprezo pelo marido, mas valoriza sua sabedoria.
d) demonstra grande admiração pela cultura filosófica de Xantós.
e) preferiria que Xantós desse mais atenção a ela que à Filosofia.