1. (FGV-RJ)
Quando Bauer, o de pés ligeiros, se apoderou da cobiçada esfera, logo o suspeitoso Naranjo lhe partiu ao encalço, mas já Brandãozinho, semelhante à chama, lhe cortou a avançada. A tarde de olhos radiosos se fez mais clara para contemplar aquele combate, enquanto os agudos gritos e imprecações em redor animavam os contendores. A uma investida de Cárdenas, o de fera catadura, o couro inquieto quase se foi depositar no arco de Castilho, que com torva face o repeliu. Eis que Djalma, de aladas plantas, rompe entre os adversários atônitos, e conduz sua presa até o solerte Julinho, que a transfere ao valoroso Didi, e este por sua vez a comunica ao belicoso Pinga. [...]
Assim gostaria eu de ouvir a descrição do jogo entre brasileiros e mexicanos, e a de todos os jogos: à maneira de Homero. Mas o estilo atual é outro, e o sentimento dramático se orna de termos técnicos.
Carlos Drummond de Andrade, Quando é dia de futebol. Rio: Record, 2002
Ao narrar o jogo entre brasileiros e mexicanos "å maneira de Homero", o autor adota o estilo:
(a) épico.
b) lírico.
c) satírico.
d) técnico.
e) teatral.
1. Carlos Drummond de Andrade adotou o gênero épico caracterizado pela narração em linguagem rebuscada de feitos gloriosos de heróis com qualidades quase divinas.
2. (PUC-RJ)
Texto 1
Espalham-se, por fim, as sombras da noite. O sertanejo que de nada cuidou, que não ouviu as harmonias da tarde, nem reparou nos esplendores do céu, que não viu a tristeza a pairar sobre a terra, que de nada se arreceia, consubstanciado como está com a solidão, para, relanceia os olhos ao derredor de si e, se no lagar pressente alguma aguada, por má que seja, apeia-se, desencilha o cavalo e reunindo logo uns gravetos bem secos, tira fogo do isqueiro, mais por distração do que por necessidade.
Sente-se deveras feliz. Nada lhe perturba a paz do espírito ou o bem-estar do corpo. Nem sequer monologa, como qualquer homem acostumado a conversar.
Raros são os seus pensamentos: ou rememora as léguas que andou, ou computa as que tem que vencer para chegar ao término da viagem.
No dia seguinte, quando aos clarões da aurora acorda toda aquela esplêndida natureza, recomeça ele a caminhar, como na véspera, como sempre.
Nada lhe parece mudado no firmamento: as nuvens de si para si são as mesmas. Dá-lhe o Sol, quando muito, os pontos cardeais, e a terra só lhe prende a atenção, quando algum sinal mais particular pode servir-lhe de marco miliário na estrada que vai trilhando.
TAUNAY, Visconde de. Inocência. Disponível em: www.dominiopublico.gov.br/download/texto/bn000002.pdf> Acesso em 20 set. 2012.
Texto 2
Na planície avermelhada, os juazeiros alargavam duas manchas verdes. Os infelizes tinham caminhado o dia inteiro, estavam cansados e famintos. Ordinariamente andavam pouco, mas como haviam repousado bastante na areia do rio seco, a viagem progredira bem três léguas. Fazia horas que procuravam uma sombra. A folhagem dos juazeiros apareceu longe, através dos galhos pelados da caatinga rala.
Arrastaram-se para lá, devagar, Sinhá Vitória com o filho mais novo escanchado no quarto e o baú de folha na cabeça, Fabiano sombrio, cambaio, o aió a tiracolo, a cuia pendurada numa correia presa ao cinturão, a espingarda de pederneira no ombro. O menino mais velho e a cachorra Baleia iam atrás.
Os juazeiros aproximaram-se, recuaram, sumiram-se. O menino mais velho pôs-se a chorar, sentou-se no chão.
- Anda, condenado do diabo, gritou-lhe o pai.
Não obtendo resultado, fustigou-o com a bainha da faca de ponta. Mas o pequeno esperneou acuado, depois sossegou, deitou-se, fechou os olhos. Fabiano ainda lhe deu algumas pancadas e esperou que ele se levantasse. Como isto não acontecesse, espiou os quatro cantos, zangado, praguejando baixo.
A caatinga estendia-se, de um vermelho indeciso salpicado de manchas brancas que eram ossadas. O voo negro dos urubus fazia círculos altos em redor de bichos moribundos.
- Anda, excomungado.
O pirralho não se mexeu, e Fabiano desejou matá-lo. Tinha o coração grosso, queria responsabilizar alguém pela sua desgraça. A seca aparecia-lhe como um fato necessário e a obstinação da criança irritava-o. Certamente esse obstáculo miúdo não era culpado, mas dificultava a marcha, e o vaqueiro precisava chegar, não sabia onde.
RAMOS, Graciliano. Vidas Secas. Rio de Janeiro: Record, 1986, p. 9-10.
Texto 3
Toda viagem é interior
embora
por fora
se vista o carro ou o trem
e se aprenda a nadar
com o navio
e a voar
pelos ares, com as bombas
e os aviões;
toda viagem
se faz por dentro
como as estações
se fabricam, invisíveis
a partir do vento
silenciosas
como quando um pensamento
muda de tempo e de marcha
distraído de si, e entra
em outro clima
com a cabeça no ar:
psiu, míssil, além do som
e de qualquer mapa
ou guia que desenrolo
míope, sobre a estrada
que passa
sob meu pé-pneumático
sob o célere céu azul
do meu chapéu;
toda viagem
avança e se alimenta
apenas de horizontes
futuros, infinitos, vazios
e nuvens:
toda viagem é anterior.
FREITAS BLHO, Armando. Longa vida. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1982, p. 115-6
a) Tomando como base a leitura comparativa dos textos 1, 2 e 3, determine o sentido da palavra "viagem" em cada um deles.
No texto 1, a palavra "viagem" tem o sentido de deslocamento espacial, representando para o personagem a passagem por diferentes paisagens. No texto 2, "viagem" representa a fuga de um lugar hostil, em que se espera encontrar um lugar melhor para sobreviver. No texto 3, o sentido de "viagem" associa-se ao plano do imaginário, ao interior do indivíduo, ao descobrir-se a si mesmo diante dos diversos lugares visitados durante a vida.
b) Determine o gênero literário predominante no texto 3, justificando a sua resposta com aspectos que o caracterizam.
O gênero literário predominante no texto 3 é o lírico, o que pode ser comprovado pela presença do eu lírico, que em tom intimista revela sentimentos e produz sensações.
3. (PUC-RJ)
Coração numeroso
Foi no Rio.
Eu passeava na Avenida quase meia-noite.
Bicos de seio batiam nos bicos de luz estrelas inumeráveis.
Havia a promessa do mar
e bondes tilintavam,
abafando o calor
que soprava no vento
e o vento vinha de Minas.
Meus paralíticos sonhos desgosto de viver
(a vida para mim é vontade de morrer)
faziam de mim homem-realejo imperturbavelmente
na Galeria Cruzeiro quente quente
e como não conhecia ninguém a não ser o doce vento mineiro,
nenhuma vontade de beber, eu disse: Acabemos com isso.
Mas tremia na cidade uma fascinação casas compridas
autos abertos correndo caminho do mar
voluptuosidade errante do calor
mil presentes da vida aos homens indiferentes,
que meu coração bateu forte, meus olhos inúteis choraram.
O mar batia em meu peito, já não batia no cais.
A rua acabou, quede as árvores? a cidade sou eu
a cidade sou eu
sou eu a cidade
meu amor.
ANDRADE, Carlos Drummond de. Reunião. Rio de Janeiro: José Olympio, 1973, p. 15-6.
a) O poema de Carlos Drummond de Andrade nos mostra a relação entre a cidade e o eu poético por meio de uma perspectiva intimista e confessional. A partir dessa constatação, determine o gênero literário predominante no texto, transcrevendo exemplos que justifiquem a sua resposta.
O texto é representativo do gênero lírico por demonstrar uma relação sentimental do eu poético com o mundo, o que pode ser comprovado em versos como "Meus paralíticos sonhos desgosto de viver / (a vida para mim é vontade de morrer)", "que meu coração bateu forte, meus olhos inúteis choraram", "O mar batia em meu peito, já não batia no cais.".
b) Contraste a primeira e a última estrofe do poema no que diz respeito à relação entre o eu poético e a cidade.
Houve entre a primeira e a última estrofe uma transformação do sentimento do eu lírico em relação à cidade. Na primeira estrofe, está presente um sentimento de estranhamento, de não pertencimento do eu poético em relação à cidade, o que pode ser comprovado pelo verso "Foi no Rio", como se a cidade fosse algo externo e estranho a ele. No decorrer das estrofes, vai ocorrendo gradualmente um processo de adaptação do eu poético com o alheio e finalmente, na última estrofe, há a construção de um novo "eu", de uma nova identidade, da qual a cidade passa a fazer parte, fusão que fica clara no verso "a cidade sou eu".
4. (PUC-RI)
Recordação
Agora, o cheiro áspero das flores
leva-me os olhos por dentro de suas pétalas.
Eram assim teus cabelos,
tuas pestanas eram assim, finas e curvas.
As pedras limosas, por onde a tarde ia aderindo,
tinham a mesma exalação de água secreta,
de talos molhados, de pólen,
de sepulcro e de ressurreição.
E as borboletas sem voz
dançavam assim veludosamente.
Restitui-te na minha memória, por dentro das flores!
Deixa virem teus olhos, como besouros de ônix, tua boca de malmequer orvalhado,
e aquelas tuas mãos dos inconsoláveis mistérios,
com suas estrelas e cruzes,
e muitas coisas tão estranhamente escritas
nas suas nítidas de folha,
-e incompreensíveis, incompreensíveis.
MEIRELES, Cecilia. Obra poética. Rio de Janeiro: José Aguilar Editora, 1972, p. 154.
a) O poema de Cecilia Meireles caracteriza-se pela visão intimista do mundo, a presença de associações sensoriais e a aproximação do humano com a natureza. A memória é a fonte de inspiração do eu poético. A partir dessas afirmações, determine o gênero literário predominante no texto, justificando sua resposta com suas próprias palavras.
O texto pertence ao gênero lírico, pois trata de uma perspectiva pessoal do eu lírico a respeito de seus próprios sentimentos.
b) Observa-se no poema a utilização de inúmeras figuras de linguagem como recurso expressivo. Destaque do texto um exemplo de prosopopeia e outro de sinestesia.
Prosopopeia "borboletas sem voz" (atribui característica humana a um animal).
Sinestesia "cheiro áspero das flores" (mistura de sensações do olfato e do tato).
5. (UFBA) Assinale as proposições verdadeiras, some os números a elas associados e marque o resultado.
Cidade prevista
Guardei-me para a epopeia
que jamais escreverei.
Poetas de Minas Gerais
e bardos do Alto-Araguaia,
vagos cantores tupis,
recolhei meu pobre acervo,
alongai meu sentimento.
O que eu escrevi não conta.
O que desejei é tudo.
Retomai minhas palavras,
meus bens, minha inquietação,
fazei o canto ardoroso,
cheio de antigo mistério
mas límpido e resplendente.
Cantai esse verso puro,
que se ouvirá no Amazonas,
na choça do sertanejo
e no subúrbio carioca,
no mato, na vila X,
no colégio, na oficina,
território de homens livres
que será nosso país
e será pátria de todos.
Irmãos, cantai esse mundo
que não verei, mas virá
um dia, dentro em mil anos,
talvez mais... não tenho pressa.
Um mundo enfim ordenado,
uma pátria sem fronteiras,
sem leis e regulamentos,
uma terra sem bandeiras,
sem igrejas nem quartéis,
sem dor, sem febre, sem ouro,
um jeito só de viver,
mas nesse jeito a variedade,
a multiplicidade toda
que há dentro de cada um.
Uma cidade sem portas,
de casas sem armadilha,
um país de riso e glória
como nunca houve nenhum.
Este país não é meu
nem vosso ainda, poetas.
Mas ele será um dia
o país de todo homem.
ANDRADE, Carlos Drummond de. A rosa do povo. In: COUTINHO, Afrânio (Org.). Carlos Drummond de Andrade: obra completa: poesia. Rio de Janeiro: Aguilar, 1964. p. 194-195. (Biblioteca Luso-Brasileira. Série Brasileira)
Analisando-se a manifestação do sujeito poético nesse poema, conclui-se que ele:
(01). aconselha outros poetas a dar continuidade à sua arte a serviço de um mundo em que tudo
encontre a sua ordem, o seu lugar.
(02). almeja um novo mundo em que as relações sociais se estabeleçam de forma transparente,
contínua e harmoniosa.
(04). vê a linguagem poética como meio único de passar bons sentimentos aos outros seres.
(08). expressa, por meio de um tom evocativo, um desejo de que a sua obra sirva de base para
outras obras.
(16). sonha com um outro mundo em que o homem viva sem convenções sociais e preserve a
sua singularidade interior.
(32). deseja que sua obra ganhe um sentido que abra um novo mundo ao homem e o homem a si
mesmo.
(64). assume uma atitude de temor em face da precariedade da existência, transportando-se para
um imaginário de reflexões íntimas.
Soma: 59 (01 + 02 + 08 + 16 + 32)
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